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| A cidade sem fim |
Já comentei que os distritos de Tóquio são prefeituras independentes, né. Pois então, Shinjuku é dos mais ricos de todos - e isso se reflete no mobiliário urbano e na conservação das ruas, que é tudo chiquérrimo e impecável. A prefeitura (o nome, derivado do português colonial, confunde; "prefeitura" é o governo estadual) é um par de torres de sessenta e três andares, com cara de microchip; a fila no elevador pra subir, apesar de ser o único mirante grátis da cidade, era pequena e não demorava muito. Lá em cima, uma grata surpresa: o monte Fuji podia não ser muito visível, como é comum na Primavera, mas em compensação tinha uma feirinha de produtos alimentícios artesanais de todas as prefeituras do Japão. Piramos bonito, olhando pra tudo e comprando ora uma coisa, ora outra. O que levou a uma surpresa menos grata: nossa câmera foi furtada. (Isso foi uma semana antes de sair a notícia de que, por conta dos furtos a turistas, a Torre Eiffel foi fechada.) Que é a explicação de por que não teve muitas fotos de Shirakawa-Go pra cá: o chip que estava dentro da câmera estava quase cheio. Tínhamos pensado em trocar, inclusive, mas resolvemos deixar mais um dia; haja leite derramado pra não se chorar.
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| A estação Miitaka |
Enfim. Voltamos à padaria francesa e almoçamos muito bem, e inda levamos um par de pães pra comer depois, e pegamos o trem para o subúrbio remoto de Mitaka, onde nos aguardava o museu do Estúdio Ghibli. Partindo de Shinjuku e seus arranha-céus, a paisagem se altera rapidamente pro bairro japonês genérico, com prédios médios e casas, mas depois disso demora séculos até rarearem os prédios. Uma parada antes de Mitaka, ainda tinha prédios médios e lojas de departamento grandes. A estação Mitaka é razoavelmente grande e com vários serviços, mas os cartazes para o estúdio Ghibli dentro dela eram de papel impresso em impressora caseira; do lado de fora da estação, uns cartazes mais profissionais da prefeitura indicavam um ônibus especial, mas como era pouco mais de um quilômetro, fomos a pé mesmo. O caminho todo era por uma rua tranquila, ladeada por um canal ou por um parque e com quebra-molas; tanto nas margens do canal como no parque, muitas cerejeiras (já sem flor nenhuma, e sim com folhas), gingkos, e maples.
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| AAAAH TOTORO TOTOROTOTORO |
A entrada do museu Ghibli parece algum tipo de mansão dos desenhos do estúdio mesmo. E tem o Totoro de bilheteiro... (como o ingresso tem que ser comprado semanas antes, na real não tem bilheteria). Na entrada, nos avisam que só pode tirar foto das áreas externas, e nunca dentro. A ideia é aproveitar dentro diretamente, ao invés de só tirar foto pra olhar depois (e, hoje em dia, selfie). Funciona; o povo parecia muito mais engajado com as exposições do que na maioria dos museus, especialmente agora na era do selfie. Também parece, dentro, uma mansão alucinada de estúdio Ghibli, com direito a uma reprodução do ateliê do Miyazaki. Um zootrópio 3d enorme. Um gatônibus de pelúcia, infelizmente proibido pra maiores de doze anos, e não aceitaram nossa explicação de que tínhamos tido um surto de crescimento precoce. Um monte de criança e adulto virando criança. Do lado de fora, o robô de Laputa e a pedra de glifos, uma loja de sorvete, e uma de cachorro quente (experimentamos o cachorro - era razoável, e vinha junto uma cerveja artesanal). A lojinha, claro, é uma das atrações do museu, e um lugar onde precisamos de toda a avareza do mundo pra não sair com mais sacolas do que um dromedário.
Na saída, fomos para a outra estação de trem, que ficava depois do parque e é parada do trem expresso. O caminho, ao lado e pelo parque, era tranquilo e bonito no lusco-fusco. Um lago com um tablado em forma de telhado de templo ajudava no efeito cênico, mas infestava o parque de mosquitos, que comemoravam felizes a primavera. Logo antes da estação do trem, essa calma toda se transformava, e a rua era hiperlotada de gente comprando em dúzias de lojas, mais a loja de departamentos anexa à estação; quase paramos pra comer num restaurante indiano, mas decidimos deixar pra comer no centro. No trem expresso de volta, que estava cheio mas não lotado, decidimos parar em Akihabara pra ver se comprávamos uma câmera para substituir a outra (que era emprestada), e dar uma olhada no bairro alucinado em geral. Os preços não eram tão convidativos assim, e parece que, com a concorrência da internet, Akihabara está se metamorfoseando de bairro de eltrônicos em bairro de turismo nerd. Muitos maid cafés, lugares onde meninas gostosinhas vestem roupas sumárias parecidas com personagens de desenho ou com aquelas fantasias de "empregada francesa." Num deles, numa esquina, a moça dançava tipo a Xuxa, de microssaia, com a bunda no vidro, o que levou um moço com cara de uns dezoito anos e roupa de sarariman a sentar no chão, no meio da rua, pra ficar olhando.
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| Cena suburbana (não, não é em Akihabara.) |
Andando pelas ruas, vimos um cartaz num prédio de que tinha uma loja de RPG, e entramos. O prédio tinha cara de antigo, um corredor de quartzolite encardida pra entrar num elevador apertado, mas a loja era grande dentro; a decepção de Thuin ficou por conta de não ter muitos RPGs japoneses mesmo, e sim uma quantidade enorme de Call of Cthulhu e D&D, traduzidos e originais. A loja tinha um cheiro de nerd antissocial não muito agradável, também... na volta, pensamos em comer em mais de um restaurante que tinha pelo caminho, mas sempre ficávamos na dúvida, até que chegamos de volta à estação sem ter decidido, e Thuin tava com as costas ruins, então decidimos descansar e comer depois. O trem que pegamos, dessa vez o local, apesar de já serem umas nove e meia, estava ESTUPIDAMENTE lotado. Não tinha os famosos empurradores, mas povo empurrava voluntariamente mesmo; parecia um scrum de rugby. Acabamos pegando o terceiro trem, um tico menos lata de sardinhas.
Nossa indecisão toda em Akihabara não tinha sido muito esperta: ao contrário de Akihabara, em volta do albergue não tinha restaurantes abertos tarde da noite de dia de semana. Então, pra não dormir com fome e de mau humor, acabamos pegando quentinhas e salgado no 7-11, pra comer no quarto; não é a marmita delícia do trem, mas matava a fome (e pra confirmar que é o país do ovo bom, mesmo na quentinha do 7-11 o ovo cozido de gema meio molenga tava gostoso).






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