Wednesday, April 6, 2016

Introdução aos trens japoneses


O saguão da estação Quioto
A imensa maioria dos trens japoneses, e quase todos os que utilizamos, pertence a um grupo de companhias chamado JR (djee-áa), que se comunicam entre si mas são independentes. São, todas elas, oriundas da fragmentação e privatização da companhia nacional de estradas de ferro; duas não foram privatizadas, as que servem as áreas menos densas e povoadas. As que foram privatizadas, o foram de modo bem diferente das companhias públicas privatizadas no Brasil ou na Inglaterra; de maneira extremamente fragmentária (nenhum ente conseguiu mais de 3% das ações de início, ou 8% hoje), com os funcionários da casa mantidos. O resultado é que ainda hoje as companhias JR se comportam como, e são chamadas de pelos japoneses comum, companhias públicas. E como continuam se coordenando, são elas que oferecem o JR Pass, que compramos e que dá a estrangeiros a possibilidade de fazer quantas viagens quiser em toda a rede de todas elas quanto tempo quiser, por uma, duas, ou três semanas. Sim, se quiséssemos poderíamos ter passado literalmente as três semanas de um trem pro outro, sem pagar nada a mais por isso.
As plataformas da estação Osaca-Central
Há também uma miríade de companhias privadas de todo tipo e tamanho, desde companhias que se rivalizam com uma das JRs menores até companhias que têm uma única linha com três ou quatro trens correndo nela. Mas essa variedade enorme (e a variedade de bitolas - a JR é toda de bitola estreita fora os trens-bala, de bitola padrão, mas as redes menores têm diversas outras) não impediu que, sob a influência da(s) JR, os tipos de serviços oferecidos por todas elas se padronizassem em quatro classes:
  • Trens locais, iguais ao metrô em áreas metropolitanas e com um pouco mais de cadeiras e menos espaço aberto em áreas rurais, parando a cada 800-1600m em metrópoles e a cada 2-5km no campo. Em tamanho, vão desde litorinas em áreas mais remotas até trens de 14 carros em Tóquio. 
Uma litorina diesel na península de Ise

  • Trens rápidos, distintos dos locais basicamente por parar menos (a cada duas ou quatro estações) e, no caso dos serviços rurais, por ter num canto do vagão um banheiro, geralmente com privada turca. 
O interior de um trem rápido rural

  • Expressos limitados, ou Lex, com cadeiras semelhantes às de um avião mas bem melhores - Thuin, que tem 1,82 de altura e 120kg, se sentia confortável nelas - que podem ser rodadas 180 graus, e duas classes de serviço (a primeira classe tem cadeiras melhores ainda), correndo a velocidades de até 160 por hora quando o traçado deixa, e geralmente com máquinas de comida e refrigerante no intervalo entre os vagões. Têm de 4 a 12 carros de comprimento, geralmente, e param a cada 15-50km. Têm banheiro com privada turca, banheiro com privada ocidental, toucador, e mictório (este, sem porta com tranca - do corredor, dá pra ver as costas do cidadão pelo vidro da porta simples.
O interior de um lex "wide view."

  • Shinkansen (o nome quer dizer literalmente "novo trem expresso," mas a JR traduz pro inglês como "superexpresso"), com 8 ou 16 carros, com o mesmo nível de conforto do lex, mas uma fileira a mais de poltronas por conta da bitola mais larga. O padrão de estações dos shinkansen paradores é exatamente o mesmo dos lex; isso porque onde foi construído o trem-bala, expressos nas linhas tradicionais foram desativados. Os serviços diretos de tav param bastante menos; no Tocaidô, o serviço que leva o nome da antiga estrada real e vai de Osaca a Tóquio, são cinco estações em 570km para o serviço mais rápido - duas na RM de Osaca, Nagóia, e duas na RM de Tóquio. 
Um parador ("kodama," aqueles bichinhos fofos do princesa mononoke, é o nome do serviço)

A maior parte da rede está eletrificada, mas ainda tem trechos sem eletricidade, e trens que percorrem esses trechos são a diesel, mesmo que a maior parte do seu percurso seja por trechos eletrificados. Não pegamos nenhum trem com locomotiva; mesmo os diesel eram TUDs, trens como os de metrô com força motriz e passageiros em mais de um vagão. Pode-se ver, misturados com os trens de passageiros, diversos trens de carga, a maioria relativamente curto (10-30 vagões) e carregando principalmente contêineres. 
Não pise na faixa amarela

Todos os maquinistas e condutores se vestem com uniformes meio militares, com luvas muito brancas. São feitas sinalizações com códigos manuais sempre que o trem vai partir, mesmo em rotas com sistemas de sinalização avançados e operação por computador. O sinal de que o trem vai partir vai dum hoom hoom meio nostálgico nas litorinas a um prreeeeeeeeeeeeee quase insuportável dos shinkansen. Bem, tem que manter o record de zero acidentes fatais em toda a rede de trem-bala, se o preço a pagar por isso é uns tímpanos estourados...
Estação Osaca-Central - o teto cobre tanto o mezanino que faz as vezes de saguão quanto as plataformas

A maioria das estações secundárias, se muito limpas (como quase tudo no Japão), são bastante simples. Mesmo estações secundárias do shinkansen têm teto de telha de cimento (que não cobre tudo) e chão de plurigoma, Propaganda é onipresente; as passarelas ligando as plataformas não têm vista nenhuma porque são corredores de cartazes de propaganda. A exceção é a linha hokuriku, a mais nova do shinkansen, inaugurada em março de 2015, que tem estações luxuosas. Estações maiores podem ou não ser também simples, mas quase sempre têm uma loja de departamentos integrada. O que é, inclusive, grande parte do segredo do sucesso das ferrovias japonesas: elas investem pesado em imóveis valorizados pela passagem do trem.
Estação Ueno (em Tóquio), vista do museu de história natural

E tem que se falar de sucesso: o shinkansen carrega mais gente do que o total de trens-bala do resto do mundo. A divisão de Tóquio da JR Leste carrega mais passageiros E mais passageiros-km do que a SNCF francesa ou a Deutsche Bahn alemã. O tocaidô tem uma frequência quase de metrô ligando Osaca a Tóquio, coisa de 3 a 5 minutos de intervalo no rush. Bem, de um metrô um pouco caro: de Osaca a Tóquio, sem promoção, paga-se 8700 ienes (350R$) pela passagem, mais 4800 (150) por um assento não marcado ou 5700 por um marcado.  Sim, a estrutura é meio bizarra; compra-se a passagem e o assento como valores separados.
A classe verde no recém-inaugurado shinkansen Hokuriku. Tsurugi é o nome do serviço (parador local), 719 o número da viagem

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