Wednesday, April 27, 2016

27.4.2015 Tóquio 17 a 21C Altitude 6m

A fachada original da estação Tóquio


Penúltimo dia da viagem, e já batendo a saudade antecipada. Também, a responsabilidade por arrumar as encomendas que nos tinham feito, e as compras que tínhamos deixado "pra depois." Como se depois fôssemos ter todo o tempo do mundo... a primeira tentativa foi da pescoceira para a mãe de Thuin, que estava precisando duma. Não conseguimos achar revendedor, mesmo com a ajuda da simpática moça do albergue. Na verdade, parece que, ao contrário do Brasil, não se compra produtos desse tipo em lugar nenhum no Japão; se você precisar, o hospital que vai fornecer. (Do seu plano; Japão não tem SUS, tem plano obrigatório, como EUA agora com Obamacare.) Por via das dúvidas, inda fizemos duas tentativas: uma na loja de departamentos em cima da estação Tóquio, outra num hospital (São Lucas) em Tsukiji, antes de irmos pro mercado de peixes, ao lado dum templo budista com cara de Índia Britânica, erguido nos anos 30. (A plaquinha do outro lado da calçada, ao lado da saída do metrô, explicava.)
O templo de Tsukiji

O mercado de Tsukiji é atração turística principalmente pelos leilões de atum, mas não tínhamos ido lá pra isso porque, né. Cinco da manhã. Então o que nos interessava era mais a auréola do mercado. Explico: o mercado propriamente dito é um centro de distribuição atacadista de peixes, servindo Tóquio (obviamente) mas também em alguma medida a ilha de Honshu inteira. Ou seja, você pode entrar (segurança no Japão é em geral infinitamente mais relax que no Brasil), mas lá dentro só vai poder ver, meio de longe, os peão mexendo com lotes grandes de peixe. Meio de longe porque aquilo é uma área comercial-industrial, não de turista, e se você chegar muito perto pode ser jogado no caminhão frigorífico, e acordar num prato em Okayama. Mas encostado nesse grande mercado tem o Jogai, o mercado exterior, que é um dédalo de lojinhas de produtos de cozinha, frutos do mar, e legumes, mais restaurantes de sushi logo do lado de fora dele, do outro lado da rua, tem um Sukiya e um McDonald's, presumivelmente pros trabalhadores do mercado que não curtem peixe; o McDonald's foi providencial pra ir ao banheiro.) Na real, também tem um monte de restauranteszinhos de ramen e gyudon, alguns, bem baratinhos, então por que alguém insistiria em ir no Sukiya ou McDonald's, não entendemos.
A sala principal do mercado atacadista de Tsukiji

Passeamos um pouco, pelo mercado exterior, e fomos bizoiar o principal, com sua longa galeria. E aí resolvemos ter uma ideia um pouco idiota: atravessá-lo pra chegar ao Hama-Rikyu, o jardim que mistura jardinagem japonesa tradicional com os últimos pedacinhos de pântano salgado que sobraram em toda a baía de Tóquio, e que é vizinho. Idiota porque A) o mercado é MUITO grande, e um pouco labiríntico (rapidamente nos demos conta de que não tinha mais nenhum turista em volta e que provavelmente não deveríamos estar lá), e, mais importante, B) o mercado NÃO TEM SAÍDA para o jardim. Só pro norte, pro mercado varejista (uns puxadinhos e barracas, fazem com que, na verdade, você não veja muito bem onde termina um e começa o outro) e pro noroeste, pra via expressa. E um cais, se a água da baía fosse mais limpa e fosse verão talvez pudéssemos ir nadando, né. Enfim, olhamos o jardim por uma fresta na cerca de aço corrugado, muito bonito, e toca-lhe a voltar a pé. Mari já azul de fome e mal-humorada.
Uma das maquininhas de transportar peixe. Não tem transmissão, gira-se o motor-tambor junto.

Entramos, enfim, no restaurante de sushi que pareceu mais simpático, e pedimos um par de menus degustação. Minúsculo, o restaurante, com um balcão só sem mesas. Idade média dos clientes lá pelos 60. Thuin estava apertado então foi ao banheiro antes de se sentar; o banheiro era pequeno e simples, com os produtos de limpeza guardados numa prateleira sobre o vaso, mas limpíssimo. E voltando, ao balcão, começou o festival do sushi. Não de quantidade (foi uma refeição razoável, mas não farta), mas de deliciosidade deliciosa. O sushiman (que adorou o fato de sermos brasileiros, explicou que o melhor amigo dele era brasileiro, e fazia as vezes de tradutor entre a gente e nossas vizinhas de balcão, que nos perguntavam se a viagem daqui pra lá não tinha sido cansativa) nos deu ouriço, sardinha, enguia (achei que era unagui, ele corrigiu "anago," enguia marinha, e não a de rio)... a "estrelinha" barriga de atum não era melhor do que nenhum dos outros. Até o sushi de omelete, de mil camadas com um molho doce ralo, era uma delícia.
Salut Maman

Na saída, passando pelas lojinhas de utensílios, mantivemos heroicamente a ilusão do "depois a gente vê" pra depois se arrepender de não comprar algumas coisas. Só Mari que insistiu em dar pra Thuin uma faca da loja de facas, de aço de Damasco. Fomos embora, naquela felicidade pós-comida da Virginia Woolf, e direto prum lugar que talvez fosse o oposto do clima "povão" de Tsukiji, a torre Mori.
A saída do metrô na torre Mori

A torre Mori é o núcleo dum empreendimento imobiliário, Roppongi Hills, que apagou boa parte do que costumava ser, digamos, a rua Augusta de Tóquio, um bairro meio mal afamado frequentado por marinheiros, pra instalar um complexo com todos os tipos de atividade. São várias torres residenciais e, no meio, uma torre gigante com escritórios, hotel, arena, shopping center de luxo, restaurantes, centro de convençoes, jardim, e dois museus. Sim, dois. O efeito é brutal, se menos agressivo do que um equivalente no Brasil seria porque não tem muros, concertinas, e seguranças. E o jardim é pequeno, mas além de lindo feito pra que você dentro dele até se sinta num parque de verdade.  Nós íamos ao museu mais metido a besta, que fica no quinquagésimo andar da torre; um elevador só pra os museus dá a impressão, pra quem está no chão (bem, "chão" - já é uns oito andares acima da rua. Mas a saída de metrô dá nesse espaço aberto, com o jardim ao lado e uma imensa Maman posta de guarda), de ser uma torrezinha independente. Só impressão; a "torre" se mistura com o corpo principal, leviatânico, lá pelo décimo ou vigésimo andar, e saímos numa galeria ampla como se o elevador fosse interno, normal, num piso que tem chapelaria e lojinha para ambos os museus; no mais popular, a que não fomos, estava tendo uma exposição sobre Naruto.
O jardim de vilão cyberpunk podar rosas

A exposição que fomos ver chamava-se "Simple Forms" (assim, em inglês), e era a coisa mais moderna (no sentido específico, daquela modernidade que já vai desaparecendo) do mundo, além de resvalar perigosamente perto do clichê de japão clean, não fosse, pelo contrário, uma exposição com obras de todo o tempo e espaço humanos, desde que pudessem ser descritas pelo título dado à exposição. Não apenas obras feitas para serem objetos de arte, mas também litogravuras da Encyclopédie, uma hélice de biplano em madeira, pedras coletadas por um monge zen, Quase tudo muito foda; era uma exposição praticamente sem "lado B," sem coisas que você olhasse e "ah tá, deixa ver a próxima sala." Uma instalação em particular, um site specific, fez com que Mari ficasse uma boa hora olhando: era um pano de filó, levantado e abaixado de forma ritmada por jatos de ar, com a janela atrás mostrando a cidade inteira - e inda por cima estava no cair da noite. Na saída da exposição principal, ainda foi interessante uma sala menor com uma exposição de fotografia; eram torii erguidos durante o império colonial japoneses, fotografados hoje em dia. Nenhum tem o santuário shintô mais associado; um está no meio de uma favela, outro num campo vazio, outro numa rua, outro ainda num parque.
Composição com filó e Tóquio

Na saída do Mori, passamos no atelier de Joel Robuchon pra comer um dos melhores e mais caros croissants possíveis, recheado de creme e morangos frescos (jantar propriamente no restaurante seria pra bolsos um tico mais fundos), e fomos correndo para Ueno pra achar coisas que tínhamos prometido comprar, mais presentes pras crianças (tínhamos resolvido não trazer presente pra adulto nenhum). De lá, já exaustos, Thuin mancando de novo, voltamos pro hostel e fomos jantar ao lado, num restaurante nepalês recomendado pela moça do balcão, um pouco mais tchuns que o da velhinha do primeiro dia mas ainda razoavelmente simples. Com curries que queimavam a língua e cervejas nepalesas e indianas geladas pra tentar amainar, e um pão de alho que lembrava vagamente um naan.




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